segunda-feira, 8 de junho de 2009

ASSOCIAÇÃO: um espaço de poder na vila mimosa



A AMOCAVIM está localizada no segundo andar, sobre a parte central do galpão. Sua sede é dividida em três salas. Uma delas – a maior e mais escondida – foi alugada para um salão de beleza. Assim, a Associação funciona nas outras duas salas: na primeira delas – um pequeno retângulo – há duas mesas (uma para a presidente e outra para o secretário), algumas cadeiras para os visitantes, uma televisão, dois computadores, um fax e um telefone. A outra sala é menor e comumente fica fechada. Desde que comecei minha pesquisa na Vila Mimosa (em 2002), a pequena sala teve diferentes usos: sala de massagem, do Curso de Informática, palestras, depósito de caixas, para o secretário dormir, um Posto de Atendimento da Caixa Econômica Federal e, depois, do banco Bradesco.
A AMOCAVIM é a entidade que responde pelos acontecimentos sociais, políticos e legais da Vila Mimosa. O discurso de seus integrantes expressa preocupações no que se refere à qualidade de vida das prostitutas na Vila, de forma que elas realizem melhor o exercício da prostituição. A Associação está composta por donas e donos de estabelecimentos de prostituição. Nesse sentido, não é uma associação de prostitutas, é uma "associação empresarial". Portanto, essa preocupação deve ser associada à idéia de que quanto mais e melhor as prostitutas trabalharem maior o lucro. Ao mesmo tempo, há diversos cursos profissionalizantes e cursos de alfabetização para prostitutas, pois também há uma crença de que é preciso proporcionar alternativas de atividades lucrativas para aquelas que não querem permanecer no exercício da prostituição. Resumidamente, as principais metas da AMOCAVIM são: atividades de intervenção ligadas à saúde, à cidadania, à segurança e à educação das prostitutas. Nos últimos anos a Associação tem mantido projetos junto ao Ministério da Saúde com o intuito de compartilhar ensinamentos sobre Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) e de distribuir preservativos gratuitamente. Além deste projeto, também há uma parceria com um Banco para o financiamento de um Posto de Saúde e, no começo de 2005, um projeto junto ao Ministério da Cultura e uma ONG norte-americana, capacitando mulheres em situação de prostituição ou moradoras do bairro para a profissão de costureira.9
Entretanto, na prática, a resolução de conflitos é o carro chefe da AMOCAVIM. Digo isto por que a principal pauta das conversas na sala da Associação giram em torno de possíveis tentativas de solucionar problemas cotidianos da zona relacionados ao seu andamento, eventuais contratempos junto às prostitutas e aos clientes, organização e discussão com donos de estabelecimentos, gerência das finanças da AMOCAVIM e participação de reuniões com seguranças, traficantes e policiais. Entretanto, a tarefa de resolver esses conflitos não é desempenhada por qualquer pessoa, apenas Graziela – dona de várias casas de prostituição desde a antiga Vila Mimosa, presidente da AMOCAVIM10 e uma das principais líderes da Vila Mimosa – tem este poder, afinal, é ela quem responde pelas questões que acontecem no espaço circunscrito da Vila. Além disso, os empreendimentos comerciais e os comerciantes ambulantes, taxistas, enfim, todos os que querem manter uma relação comercial no complexo da Vila Mimosa, precisam de seu consentimento (e pagar uma taxa monetária). Nos últimos tempos, o grupo responsável pela segurança na Vila tem tencionado esse poder e, assim, medido força com a Associação, para autorizar ou não o estabelecimento de outros negócios. Um exemplo foi o consentimento para que o primeiro estrangeiro se tornasse dono de um estabelecimento de prostituição. É certo que esta atitude além de marcar uma disputa velada entre a Associação e o grupo da segurança, também abre uma nova etapa, o que muito dos meus informantes chamam "a invasão dos gringos". Os estrangeiros na Vila Mimosa nunca foram bem aceitos. Em diferentes situações vi donos de casa, comerciantes e/ou prostitutas em conflito com eles, não importando quem fosse, bastava apenas falar numa outra língua. Um fragmento das minhas anotações de campo explicita a questão:
Em uma tarde ajudava na organização de um evento que escolheria a Gatinha Mimosa. Naquele momento me encontrava só na sala da Associação, organizando os itens de notas que os jurados usariam para a escolha da "Gatinha". Repentinamente adentra esbaforido e aos berros um homem. Rapidamente o reconheci, era Milton, um dono de estabelecimento mal falado pelos componentes da AMOCAVIM em razão dos vários problemas que provoca quanto ao bom andamento da Vila Mimosa. Milton não deve ter demorado mais do que dois minutos dentro da sala, depois de "gritar" seu problema, virou-se e saiu pisando firme e falando palavras que eu não mais entendia. Na minha frente Milton esbravejou: Tem um gringo que tá tirando fotos das minhas meninas. É a última vez que venho reclamar, se ele aparecer mais uma vez na minha frente é um homem morto.
Esta é uma das tantas cenas que presenciei o embate de donos de casa que se consideravam verdadeiros donos da zona com aqueles que vinham de fora. Nesse caso específico tratava-se de dois jornalistas alemães que pagaram por uma reportagem sobre a Vila Mimosa. Eles foram alertados que não poderiam tirar fotos. Entretanto, em uma negociação à parte, uma prostituta se permitiu fotografar, só que o jornalista resolveu fazer isso dentro da casa de prostituição de Milton. Mais tarde, como a prostituta havia recebido dinheiro para posar para as fotos, eles foram para um estabelecimento com pouco movimento acompanhado de um membro da Associação, que o defenderia de possíveis confusões. Este exemplo sugere que o embate com os estrangeiros é uma questão que vai além dos muros da AMOCAVIM. Veremos no decorrer do artigo que os estrangeiros são também considerados aqueles que podem ser enganados com mais facilidade e isto significa a possibilidade de obtenção de um lucro maior.
Nos últimos anos, o poder de Graziela também tem sido ameaçado a partir do ganho de espaço de Cleuza, responsável pela equipe e pela execução de projetos de intervenção. É ela quem busca o diálogo com entidades, associações, organizações, governo, pesquisadores. O objetivo é tornar a Associação respeitada politicamente e (re)conhecida como um lugar que mantém um trabalho de intervenção sério e competente. No último ano houve contratação de profissionais formados que realizam um trabalho com o objetivo de desmistificar a idéia de que a AMOCAVIM é composta por "cafetinas" – exploradoras da atividade da prostituição –, acusação feita por outros setores sociais, principalmente, ONG's especializadas no tema da prostituição, o que impede a AMOCAVIM de crescer e se estabelecer como uma associação engajada na luta de melhorias para o "mundo da prostituição".À primeira vista, parece que Cleuza tem mais visibilidade política do que Graziela, no entanto, isso não significa que há mais poder e/ou prestígio. Até por que Graziela, certamente, tem maior respeitabilidade, autoridade e comando na Vila Mimosa, poucas vezes vi uma decisão sua ser questionada. Contudo, nesse jogo pela busca de poder e prestígio, parece-me que as duas mulheres encontraram uma maneira de se mover e, assim, demonstrar valentia. Por conseguinte, de uma forma ou de outra, ambas fortalecem seu lugar na Associação e, ao mesmo tempo, fortalecem a Associação como um instrumento de domínio e de poder o que lhes garante autoridade e prestígio.

2 comentários:

  1. Olá Claudinho!

    Vc tem um e-mail para que eu possa fazer um contato contigo?

    Sou estudante de JOrnalismo e estou fazendo meu trabalho de conclusão de curso sobre a Vila Mimosa.

    Meu e-mail é veronica.b.garcia@gmail.com

    Abçs,
    Verônica Garcia.

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  2. Queridos,
    Preciso do contato da Cleide ou da Graziela para possivel parceria com o Grupo pela VIDDA/RJ.
    Mara Moreira
    maragpv@yahoo.com.br

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